Carreiras quentes: veja as áreas com mais demanda por profissionais para 2022

O noticiário bate numa só tecla: o desemprego. De fato. Nunca vimos índices acima dos 14%. Mas há um outro lado nessa moeda: mesmo com recessão, pandemia e desgoverno, o Brasil ainda é a 12ª maior economia entre as 207 nações monitoradas pelo Banco Mundial. Nossa indústria, comércio e serviços garantem um PIB que coloca o Brasil bem à frente de outras nações. O bolo segue pessimamente dividido, claro, mas é grande.
Nisso, os donos do bolo se deparam com um problema: a má formação dos brasileiros. Trata-se do legado mais podre dessa má divisão: um país que não encontrou um jeito de melhorar a educação e capacitação profissional da maioria de seus cidadãos.

O resultado é que, mesmo com 14 milhões de pessoas em busca de trabalho, 69% dos empregadores se queixam da falta de profissionais qualificados. É o que mostra o Guia Salarial da empresa de recrutamento Robert Half – que traz as expectativas das carreiras com mais demanda para 2022.

Nessa realidade, quem está mais bem preparado vira ouro. Os mais disputados ainda são os trabalhadores de tecnologia. Todos os segmentos da economia precisaram abraçar a “transformação digital” e a TI, que já era essencial, ganha ainda mais destaque.
Outra área em evidência é o marketing. O celular se tornou o novo shopping. Isso virou de ponta-cabeça as estratégias de divulgação, e precisa-se de gente nova para tocar essa revolução dentro das empresas.

Um fator que está movimentando o mercado é o aumento de fusões e aquisições. Entre as mais célebres, estão a da varejista Grupo Soma, que comprou a Hering por R$ 5,1 bilhões; e a junção entre a Hapvida e a NotreDame Intermédica. Mas dados da consultoria KPMG mostram que, em dez anos, nunca houve tantas operações desse tipo. Só no primeiro semestre, foram 804. Isso joga luz nos profissionais de M&A – mergers and acquisitions, ou fusões & aquisições, no bom e cada vez menos utilizado português. Esses profissionais são responsáveis por acompanhar todo o processo de compra, venda ou fusão das companhias.

A crise, porém, bate na parte salarial. “Para o próximo ano, a gente não deve ver mudanças gritantes. As empresas ainda estão preocupadas com o impacto da Covid-19 na economia e isso afeta a remuneração”, afirma Fernando Mantovani, diretor-geral da Robert Half para a América do Sul.

Veja quais são as expectativas para o mercado de acordo com a Robert Half, além dos cargos e salários para as sete áreas de atuação que devem bombar em 2022.


Como ler as tabelas

Os salários listados aqui não incluem bônus, benefícios e outras formas de remuneração. O valor de cada cargo é dividido em três perfis nos quais cada faixa é determinada pelo nível de qualificação, experiência do candidato e complexidade do cargo. Os comparativos salariais entre os anos de 2021 e 2022 foram feitos com base no perfil B, no qual a maior parte dos profissionais se encontra.

Perfil A – Já tem uma experiência mais relevante, com pós-graduação, certificações e especializações.

Perfil B – É aquele que preenche a maioria dos pré-requisitos da vaga – não precisa de desenvolvimento para exercer satisfatoriamente o cargo.

Perfil C – Profissional com pouca experiência, ou que acabou de ser promovido, e que precisa de desenvolvimento para exercer plenamente a função.

Tamanho da companhia*: P – Pequena | B – Boutique** | M – Média | Grande

*Divisão baseada em faturamento — P/M: até R$ 500 milhões; G: acima de R$ 500 milhões. No caso dos escritórios de advocacia, o parâmetro é outro, de acordo com número de advogados — P e B: de 1 a 30; M: de 30 a 150; G: acima de 150.

**Classificação exclusiva para o setor jurídico. Os “escritórios boutique” são pequenos, mas altamente especializados e segmentados.


FINANÇAS E CONTABILIDADE

O filé mignon financeiro

Se no começo da pandemia a área de finanças foi essencial para controlar os custos das companhias, agora é ela quem lidera a expansão das empresas para uma eventual retomada.

E surgem cargos mais especializados. “Antes, a gente sentia uma demanda maior para áreas de contabilidade, controle fiscal e tesouraria. Agora, saímos desse arroz com feijão e estamos no filé mignon da área. A tendência é de aumento dos profissionais de planejamento financeiro, fusões & aquisições, relações com investidores e captação de recursos”, afirma Marcela Esteves, gerente de recrutamento da Robert Half.

O setor cada vez mais exige profissionais que lidem com grandes quantidades de dados. Logo, conhecimento avançado de ferramentas de business intelligence e ERP (sistema integrado de gestão empresarial) e, claro, Excel, são essenciais. A vantagem da transformação digital é a diminuição de atividades operacionais – já que vários processos se tornam automatizados. Isso abre espaço para profissionais com maior capacidade analítica e visão estratégica.

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No olho do furacão
Maria Isabel Antonini, de 35 anos, lida com M&A há dez anos. Passou pelo Itaú, Grupo Pão de Açúcar e Via. Mas ela afirma que um dos seus maiores desafios profissionais foi ano passado, como CFO da startup de beleza Singu. A belo-horizontina liderou as negociações de investimento entre a Singu e a Natura. “Um processo de fusão entre uma startup e uma grande empresa é como se fosse uma operação entre Davi e Golias. É mais difícil de precificar, alinhar a parte burocrática e conseguir se impor nas negociações.” Claro que conhecimento técnico, como o de modelagem financeira (conjunto de técnicas para atribuir o preço justo de uma empresa no mercado), conta (e muito) para exercer o cargo. Mas ela destaca que a habilidade mais importante para o profissional de fusões e aquisições é o jogo de cintura. “Quando você senta em uma mesa de negociação, tem vários interesses no meio e agendas diferentes. Saber ouvir e ser flexível é fundamental.”

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VENDAS E MARKETING

Na cola da tecnologia
A alta no número de lojas online aumentou também a concorrência dentro do e-commerce e a necessidade de investir pesado nas equipes de marketing. Afinal, as empresas não concorrem mais com a loja do outro lado da rua, ou do outro andar do shopping, mas no terreno digital. “Quem estava olhando para essa área um ano atrás, vê outro setor hoje. A demanda por esses profissionais cresceu em empresas de todos os segmentos e já estamos lidando com funções novas, como analista de marketplace”, diz Carolina Cabral, gerente de recrutamento da Robert Half.

O setor não só se espelha na expansão do TI. Ele também está mais próximo da tecnologia. Alexandre Marquesi, professor da pós-graduação da ESPM, lembra que a principal habilidade exigida hoje dos profissionais de marketing é trabalhar bem com dados. “O mercado quer um profissional que saiba olhar para os dados e encontrar oportunidades ali, que saiba montar uma estratégia a partir disso.” É o famoso business intelligence (BI). Você se baseia nos dados para saber quais produtos podem ser retirados do portfólio ou quais canais de venda precisam de mais investimento para alcançar seu potencial verdadeiro.

Também é fundamental que o novo profissional desse setor entenda de marketing digital – as atividades online para conquistar mais consumidores, melhorar o relacionamento com os clientes recorrentes e tornar a marca da empresa mais sólida.

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“Me coloco no lugar do cliente”
Entender o cliente é tarefa de Uribe Teófilo, 38 anos. Hoje, o paulistano é gerente de produtos da seguradora Youse Insurance. Mas sua carreira começou em 2007, quando foi trabalhar no Buscapé. Foi lá que ele passou a atuar com comportamento dos consumidores na internet. De seus 14 anos de experiência, ele tira uma lição: é preciso empatia para se dar bem no setor. “Quando estou oferecendo um produto, estou resolvendo um problema do cliente. Mas só consigo fazer isso quando me coloco no lugar da pessoa e escuto o que ela quer.” Nem tudo é na base da habilidade comportamental. De novo: você precisa tratar com carinho as análises de dados – como criar bons testes A/B (metodologia que compara diferentes abordagens de marketing com diferentes consumidores) e saber atuar com a chamada metodologia ágil, ou seja, fracionar as entregas de um projeto, para permitir correções mais precisas ao longo do caminho – uma filosofia que contrapõe o método tradicional, de entregar o pacote completo e só depois ver se funciona.

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JURÍDICO

Na onda das reestruturações
Se o governo, o vírus e São Pedro não atrapalharem mais, a tendência é de uma recuperação econômica. O que significa mais trabalho para o pessoal do jurídico.

“Num cenário assim, as empresas voltam a alavancar os negócios e investimentos que estavam parados. O mercado do direito societário e de contratos, então, será um dos mais aquecidos”, diz Mariana Horno, gerente de recrutamento da Robert Half.
A alta histórica nas operações de M&A também criou um universo de necessidades na área jurídica. As contratações estão focadas em pessoas com experiência em fusões e aquisições, compliance e reestruturações societárias.

Mas não é só isso. Empresas de tecnologia estão fortalecendo os seus departamentos jurídicos, porque existe uma carência de legislações e órgãos reguladores. Na saúde tem a ANS para regular os convênios; o Banco Central fica de olho nas instituições financeiras. Mas não tem ninguém para orientar as companhias de tecnologia. Por isso, o advogado que atua com tech precisa estar atualizado em tempo real sobre as discussões que envolvem o setor. Está rolando na Câmara, por exemplo, um Marco Legal para debater o uso ético do aprendizado de máquinas – imagine o monte de regras novas que deve sair desse mato…

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SEGUROS

Insurtechs
Conhecido por ser um setor conservador, o segmento de seguros passa por uma forte transformação digital no último ano. E o perfil das empresas está mudando: entraram em cena as insurtechs (neologismo que junta as palavras seguro e tecnologia, em inglês, igual em fintech quando o assunto é finanças). São startups que buscam desburocratizar o setor.

Trata-se de um trabalho em andamento. Faz tempo que dá para fazer seguros pela internet, sem a intermediação de um corretor. Mas, quando você lê aquela tonelada de letras miúdas, com cláusulas que parecem ter sido escritas por um tribunal da inquisição, tende a preferir pagar um extra de 15% ao corretor. E o investimento no digital vai para o ralo.

Como disse Heverton Peixoto, CEO da seguradora Wiz, numa entrevista recente à Você S/A: “Enquanto os produtos forem enlatados, cheios de cláusulas, dando a sensação de que você não vai conseguir usar quando for necessário, nada vai mudar. O seguro tem que estar envolvido no relacionamento”. Ou seja: nada mais é do que entender a experiência do cliente. O mundo ideal para o setor é um em que a comunicação entre a empresa e o segurado seja simples, direta, sem firula. E, para isso, precisa-se de profissionais inovadores, corajosos, de cabeça aberta.

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MERCADO FINANCEIRO

Mais trabalho pela frente
Só neste ano, 40 empresas já engrossaram a lista de companhias com capital aberto no Ibovespa . Bom para elas, que estão captando mais dinheiro, e ainda melhor para os profissionais que trabalham com equity research. Essa é uma área comum dentro dos bancos e corretoras, e desempenha um papel essencial: estudar os fundamentos de uma empresa para determinar se ela é ou não uma boa opção de investimento, e analisar a flutuação do preço das ações, para saber se vale ou não vale comprar tal papel.

Hoje, com cada vez mais empresas para acompanhar e cada vez mais pessoas físicas investindo em ações, cresce também o número de casas de análise – que não são bancos nem corretoras, apenas instituições que fornecem relatórios sobre o mercado. Algumas delas contam com dezenas de analistas.

Mesmo porque escarafunchar balanços e formular análises sobre o desempenho de um setor ou de uma empresa para o futuro não é um trabalho simples – nem uma ciência exata. Chovem erros. E isso é bom: torna os melhores analistas um ativo particularmente valioso.

Vale destacar que, para atuar no mercado financeiro, é obrigatório que o profissional tenha algumas certificações. Elas variam de acordo com a atividade exercida. Para quem quer ser analista, por exemplo, o CNPI é indispensável. Mas também tem o CPA, que é destinado para funcionários de bancos e corretoras que lidam diretamente com clientes; e até certificados internacionais, que não são obrigatórios, mas dão um gás na carreira, como CIIA (Certificado Internacional de Analista de Investimentos).

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“Meu trabalho é estudar”
Eduardo da Rocha Lopes, de 27 anos, se formou em engenharia mecânica em Niterói (RJ). Como a região abriga empresas de óleo e gás, o mineiro começou a carreira nesse setor, mas sempre com vontade de aprender economia. “Eu gostava de mercado financeiro, mas não tinha ideia de como atuar na área. Até que, em 2019, soube que o Santander estava contratando engenheiros e vi uma oportunidade de mudar minha carreira.” Lá no banco, ele atuava como analista de produtos, mas o seu sonho era entrar na área de equity research. Para isso, começou a estudar sobre o mercado e a tirar os certificados necessários. E, no ano seguinte, foi contratado como analista de equity research na Santa Fé Investimentos. “Meu trabalho é estudar. Eu passo o dia todo pesquisando sobre empresas e os setores em que elas atuam. Para quem quer trabalhar com isso, é essencial que seja curioso e tenha vontade de aprender.”

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TECNOLOGIA

Guerra por talentos
O mercado de trabalho para tecnologia está aquecido desde a invenção da roda, e segue se provando indestrutível. “Mesmo dentro de um cenário de pandemia, a busca por profissionais de TI não cessou. Muito pelo contrário. Todos os setores econômicos estão em processo de transformação digital e demandam por pessoas para trabalhar com tecnologia”, diz Wagner Sanchez, diretor acadêmico do Centro Universitário FIAP.

O interesse pelos melhores profissionais é tanto que, não raro, quem dita as regras do jogo são os candidatos. Muitas vezes, uma mesma pessoa está participando de mais de um processo seletivo ao mesmo tempo, e ela não vai ter medo de recusar uma proposta pouco interessante. Isso causa guerras entre companhias para atrair e reter os melhores da área.

Muitas vezes, a briga é entre empresas de países diferentes. A pandemia quebrou de vez as poucas barreiras geográficas que ainda existiam no mercado de tecnologia. “Agora, as disputas por talentos são com empresas de fora, principalmente por causa da alta do dólar. As companhias do exterior perceberam que elas conseguem contratar mão de obra brasileira de alta qualidade por um custo bem mais baixo”, afirma Mariana Horno, da Robert Half.

Entre os profissionais que se destacam para o ano que vem, não há grandes novidades: são os de segurança cibernética, cientistas de dados, programadores, especialistas em inteligência artificial e robótica.

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Hacker do bem
Quando começou a faculdade de Direito, Daniel Zaia Manzano (33 anos) nem imaginava cair na área de TI. “No meio do curso, percebi que gostava de informática e decidi mudar de carreira”, relembra o paulistano. Daniel é um pentester – também conhecido como “hacker do bem”. O seu trabalho é simular ataques a sistemas de segurança de empresas e bancos para encontrar vulnerabilidades. O desafio, ele diz, é estar atualizado com tudo que envolve ferramentas antifraude e tentativas de golpes (porque o que não falta aí é novidade). E Daniel lembra que não tem mais essa de o profissional aprender tudo sozinho. “A formação acadêmica é importante para dar uma base teórica e também existem certificações importantes para a área [como o CISSP, destinado para quem trabalha com segurança de rede; e o OSCP, sobre ética de hacking]. Ser autodidata hoje significa ser curioso e buscar novos conhecimentos, mas sem pular a educação tradicional.”

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ENGENHARIA

A hora e a vez da logística
O último ano e meio marcou a grande virada do e-commerce. Mesmo quem ainda torcia o nariz para comprar pela internet já busca até sifão de pia nos marketplaces da vida em vez de sair na rua para procurar por um. A logística para fazer um sifão sair do Espírito Santo e chegar aSão Paulo no dia seguinte é, obviamente, espetacular. E, enquanto não inventarem o teletransporte, ela vai demandar cada vez mais, e melhores, engenheiros especializados.

Trabalhar com logística no Brasil é algo particularmente desafiador. O país é do tamanho de metade da Lua (um pouco maior, na verdade), e a maior parte do transporte é por caminhão, em estradas sacolejantes.

Por essas, as empresas não querem só profissionais capazes de tocar competentemente o dia a dia da operação. Estão de olho em gente que busque melhorar os processos o tempo todo – tipo: “Vale fretar um avião para fazer tal rota e garantir a entrega para o dia seguinte? Talvez”.

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Agradecimentos: Ângelo Zanini, coordenador do curso de Engenharia da Computação do Instituto Mauá de Tecnologia; Claudia Yoshinaga, coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV; e os gerentes de recrutamento da Robert Half Alexandre Mendonça, Amanda Adami, Ana Carla Guimarães, André Bambini, Carolina Cabral, Erika Moraes, Leonardo Berto e Vitor Silva.

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