Nem agressivo, nem passivo: o segredo é ser um líder equilibrista

Como encontrar o equilíbrio entre a agressividade e a passividade? Essa é a pergunta que Jocko Willink e Leif Babin, ex-integrantes do Seal Navy, grupo de elite da Marinha americana, respondem no livro A Dicotomia da Liderança.

Quando saíram das Forças Armadas, os autores se especializaram em gestão de equipes e criaram uma consultoria que ajuda a construir times de alto desempenho. Para isso, usam a experiência que adquiriram no Seal.

Neste livro, o segundo da dupla, a proposta é ajudar os líderes a achar o caminho do meio. “Muitas vezes a liderança exige equilíbrio, e não comportamentos extremos. Encontrar o equilíbrio entre tendências tão diversas é o obstáculo mais difícil para os líderes.” Leia um trecho inédito a seguir.


TRECHO DO LIVRO

CAPÍTULO 9

Um líder e um seguidor

(…)
Ao longo da minha carreira na Marinha, muitas vezes quis mostrar serviço na liderança, mas falhei em seguir. Isso, em vez de destacar meu desempenho como líder diante da equipe, só prejudicou minha liderança. Nesses casos, tive que trabalhar pesado para reconquistar a confiança do grupo.

Como novato no comando de um pelotão da Unidade de Tarefas Bruiser, não compreendi esse ponto durante uma operação de treina¬mento, logo depois de me integrar à Equipe SEAL. Antes da missão em Ramadi, durante o ciclo de treinamento, desenvolvemos as habilidades de subir a bordo e controlar embarcações em alto-mar. Essas técnicas são conhecidas como operações de “Visitar, Embarcar, Procurar e Dominar”.

Antes das simulações em alto-mar, programamos várias horas de ensaios para fixar os procedimentos operacionais padrão e praticar movimentos, táticas e comunicações em um navio atracado no Porto de San Diego. Foi um ótimo treinamento para a complexa tarefa de embarcar e dominar uma embarcação em movimento.

Como alguns membros dos Pelotões Charlie e Delta haviam sido destacados para outros cursos e qualificações, naquele dia, a Unidade de Tarefas Bruiser era formada por indivíduos dos dois pelotões. Eu estava no comando, e nenhum dos líderes seniores do Pelotão Charlie pôde participar. Na verdade, o SEAL mais experiente ali era um membro do Pelotão Delta. Ele não era chefe nem suboficial, mas tinha várias missões no currículo. Como SEAL, eu só havia cumprido um turno até aquele momento.

Iniciamos os exercícios de movimentação, e os SEALs começaram a correr pelo convés para praticar o Cobrir e Mobilizar. Tudo estava indo bem até identificarmos um problema na terminologia que a equipe usava para se comunicar. Havia muitos termos diferentes circulando. Claramente, a equipe precisava se alinhar.

“Esse era o procedimento do meu pelotão anterior”, eu disse. “Vamos aplicá-lo.”

Comuniquei a ordem a todos quando reunimos a tropa para apre¬sentar o relatório do exercício.

O experiente suboficial do Pelotão Delta discordou. “Talvez seja melhor aplicar outro padrão”, ele disse, sugerindo um procedimento que já conhecia.

“Já dei a ordem”, eu disse. “Vai ser um saco mudar agora. Vamos aplicar esse padrão por enquanto.”

“Seu método não me parece adequado”, ele respondeu. “O procedimento dos meus dois pelotões anteriores é bem melhor.”

Para mim, as vantagens e desvantagens dos dois métodos não eram expressivas. Só o que importava era que a equipe estivesse alinhada. E, como eu comunicara a ordem, pensei que era mais fácil seguir nessa linha.

“Vamos aplicar o meu método por enquanto”, eu disse. “Na volta, podemos conversar com o Tony [chefe do Pelotão Charlie] e com o chefe do Pelotão Delta.”

“Não é bom desenvolver hábitos ruins”, insistiu o SEAL. “Minha sugestão é mais eficiente.”

Cada vez mais impaciente, vi que ele estava querendo bater de frente. Por ser um jovem e inexperiente comandante de pelotão, concluí que era hora de mostrar quem estava no comando, que eu era o responsável.

“Vamos fazer do meu jeito”, eu disse. “A conversa acabou.”

Em seguida, o suboficial e eu retomamos os exercícios, mas, logo depois, encerramos o treinamento e voltamos para a equipe. Até mesmo naquele momento, eu sabia que não tinha lidado bem com a situação. Aquela era a pior forma de liderança: ganhar uma discussão recorrendo à hierarquia ou à função. Na Marinha, chamamos isso de jogar uma partida de “Pedra, Papel e Patente” (em vez de “Pedra, Papel e Tesou¬ra”), sabendo que a patente vence todas as vezes. Mas nunca consegui respeitar os líderes que já vi recorrendo a esse tipo de postura. Sem dúvida, esse não era o líder que eu queria ser; no caminho de volta, me senti constrangido com essa atitude.

De volta à equipe, abordei o suboficial e pedi desculpas pela minha reação. Eu disse que deveria ter aplicado o método dele. Ele destacou que fora um erro discutir comigo na frente da unidade de tarefas. A conversa teve um resultado positivo. Decidi que nunca mais repetiria aquele episódio.

Na hora, achei que, se implementasse a sugestão do suboficial, pareceria fraco como líder. Mas, depois de pensar melhor, concluí que não era nada disso. Se eu tivesse dado ouvidos ao líder mais experiente, teria me fortalecido na liderança. Essa postura teria indicado que eu estava disposto a seguir e a liderar. Teria demonstrado claramente que eu não achava que tinha todas as repostas e que poderia ouvir profissionais mais experientes e mais bem preparados para orientar um determinado aspecto da equipe e da missão.

As pequenas diferenças entre os dois métodos eram insignificantes do ponto de vista tático. Mas aquela oportunidade desperdiçada de demonstrar minha força na liderança como alguém aberto a sugestões fora uma perda estratégica. Com esse fracasso, aprendi uma importante lição, que aproveitei em minha carreira e que o Pelotão Charlie e a Bruiser aplicaram para se destacar na liderança e vencer com mais eficiência.

O líder deve estar sempre disposto a assumir a responsabilidade e tomar decisões cruciais para o sucesso da equipe e da missão. O termo “líder” já diz tudo isso. Por outro lado, ele também deve estar sempre disposto a seguir. Essa é uma dicotomia complexa: um bom líder também é um bom seguidor. Aprender a equilibrar esses dois polos é fundamental.

Princípio

O líder deve estar sempre disposto a liderar, mas tão importante quanto isso é sua habilidade de seguir. Ele deve dar ouvidos à experiência e às ideias das outras pessoas para o bem da equipe. Deve saber escutar e seguir outras pessoas, até mesmo integrantes novatos e menos experientes. Quando alguém tem uma boa ideia ou competências específicas para orientar um determinado projeto, o líder eficiente não se importa com a atribuição do crédito, mas com a máxima eficácia possível na execução da missão.

O líder confiante incentiva os novatos da equipe a se prontificarem e assumirem a liderança quando eles apresentam ideias que contribuem para o sucesso da missão. Quando a equipe vence, o líder recebe grande parte do crédito, mesmo que não tenha coordenado a operação, as táticas e a estratégia, mas um líder eficiente sempre transfere os elogios e as distinções para o grupo.

Um líder eficiente também deve ser um bom seguidor para os seus superiores. Como escrevemos em Responsabilidade Extrema: “Uma das funções mais importantes do líder é apoiar seu chefe.” Após o debate sobre uma determinada linha de ação, quando seu chefe toma uma decisão, mesmo que você discorde dele, “execute o plano como se fosse seu”.

O líder subordinado só deve contestar seus superiores quando as ordens da liderança sênior forem ilegais, imorais, antiéticas ou associadas a riscos graves para a vida e a integridade física dos profissionais ou para o sucesso estratégico da organização. Isso raramente ocorre. O Capítulo 11 (“Seja Humilde, mas Não Passivo”) deste livro analisa essa dicotomia.

Em circunstâncias normais, o líder eficiente deve seguir e apoiar seus superiores. Muitas vezes, os líderes natos, sempre inclinados a assumir o comando, têm dificuldades para seguir um líder menos competente, pouco agressivo e sem carisma nem inspiração. Seja como for, mesmo quando as ordens lícitas dos chefes ou superiores vão de encontro às suas ideias, o líder subordinado ainda assim tem que cumpri-las e demonstrar apoio à chefia ou diretoria. Caso contrário, a autoridade da hierarquia de comando será prejudicada, inclusive a do líder contestador.

Falhar no dever de seguir também cria um antagonismo em relação aos superiores, minando a disposição dos chefes diante dos comentários e sugestões do líder subordinado, o que prejudica a equipe. Quando não são bons seguidores, os líderes falham diante deles mesmos e do grupo. Mas, quando o líder se mostra disposto a seguir, a equipe atua com eficiência e a probabilidade de sucesso na missão aumenta exponencialmente. Essa dicotomia deve ser equilibrada: seja um líder e um seguidor.

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