Setembro Amarelo: burnout e o esgotamento físico e mental no trabalho

A relações-públicas Luiza Ramos tinha 26 anos e estava há dois sem tirar férias quando teve um esgotamento profissional. Deu uma pausa nas atividades e foi para a Bahia passar uns dias.  “Conheci pessoas com histórias de vida inspiradoras e diferentes, que não se preocuparam com o quanto eu ganhava, se eu tinha um cargo e sobrenome. Dancei, me diverti – percebi que tinha muita coisa para viver”, conta.

Quando voltou a São Paulo, teve uma crise no aeroporto. “Comecei a chorar. Parecia que eu não pertencia mais àquele lugar; não queria mais aquela rotina”, diz. A angústia continuou quando voltou ao trabalho. “Não me sentia empolgada, não conseguia entender como eu tinha conseguido passar os últimos seis anos da minha vida trancada em uma sala branca, com janelas que não abrem e uma temperatura regulada por um controle remoto.”

Outro ponto que contribuiu para seu esgotamento foi o fato de ter entrado muito cedo para a faculdade, com 17 anos. Aos 26, já tinha concluído a pós-graduação. “Acho que foi resultado também dessa cobrança que eu me impunha, de ser bem-sucedida na carreira tão cedo”, afirma.

A crise pela qual Luiza passou é chamada de síndrome de burnout, incluída na Classificação Internacional de Doenças (Cid-11), que irá vigorar a partir de janeiro de 2022.

Essa lista, elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), inclui doenças e outras condições de saúde, categoria na qual se encaixa a síndrome de burnout, no capítulo de “problemas associados” ao emprego ou ao desemprego. É descrita como “uma síndrome resultante de um estresse crônico no trabalho que não foi administrado com êxito”. 

A condição foi documentada na década de 1970 e pode ser confundida com a depressão, já que os sintomas físicos e cognitivos são bem parecidos (veja mais detalhes ao fim desta reportagem). A diferença é sutil, e a principal é que o burnout se refere ao esgotamento físico e mental estritamente relacionado ao trabalho, explica José Gallucci Neto, diretor médico no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. “Fora do trabalho, a pessoa funciona relativamente bem, mas, quando volta para esse ambiente, os sintomas retornam”, explica. 

Burnout x depressão

Apesar de ser uma condição menos grave do que a depressão, o burnout é preocupante o suficiente para justificar o tratamento e o afastamento das atividades profissionais, adverte Luiz Scocca, psiquiatra e médico colaborador pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Essa deve ser a abordagem inicial contra o problema, já que o trabalho é o agressor, o estressor que faz com que a pessoa adoeça.

Em seguida, é preciso um encaminhamento médico para checar se existe um quadro depressivo associado. “O burnout pode ser considerado um predecessor da depressão. Nem todas as pessoas em burnout estão deprimidas, mas são potenciais pacientes psiquiátricos”, diz João Silvestre Silva-Junior, professor de Medicina do Trabalho do Centro Universitário São Camilo

Luiza percebeu o risco que corria se continuasse no ambiente que estava causando seu esgotamento, e resolveu embarcar novamente para a Bahia, onde passou três meses trabalhando em um bar à beira da praia.

Ela conta que nunca pensou em largar tudo para sempre, mas achou que merecia e precisava se dar esse tempo. “Foi um reencontro comigo. Percebi que não quero mais ser essa pessoa estressada, que só trabalha e vive esgotada. Agora, cinco anos depois da crise, aprendi a ressignificar o trabalho e a relativizar os problemas corporativos”, afirma. 

Como identificar o problema

É importante que haja acompanhamento profissional, para fazer um diagnóstico, mas alguns sintomas podem ser identificados, segundo Ana Carolina Souza, neurocientista e sócia da Nêmesis, empresa de assessoria e educação corporativa na área de neurociência organizacional. 

  • Sensação de esgotamento físico e mental
  • Perda de interesse nas atividades de trabalho
  • Sentimentos negativos associados ao ambiente corporativo
  • Falta de motivação para ir trabalhar (muitas vezes, associada ao absenteísmo)
  • Irritabilidade
  • Ansiedade
  • Baixa autoestima
  • Dificuldade de concentração
  • Pessimismo
  • Dores de cabeça constantes
  • Fadiga
  • Palpitação
  • Pressão alta
  • Tensão muscular
  • Insônia
  • Problemas gastrintestinais
  • Gripes e resfriados recorrentes

Como prevenir

Algumas atitudes ajudam a administrar o estresse no trabalho e evitar que a rotina comprometa a saúde, segundo a coach Juliana Carelli, especializada em carreira e estilo de vida

* Aceite a vulnerabilidade e o fato de que nunca dará conta de tudo.

* Respeite os seus limites – e os dos outros. 

* Tenha uma rotina e faça constantemente ajustes nos seus planos, reorganizando objetivos e prioridades.

* Delegue mais.

* Limite o uso dos aparelhos eletrônicos e o envio e checagem de e-mails e mensagens fora do horário de trabalho.

* Cuida da sua qualidade de vida e incentive que os demais façam o mesmo, incluindo a prática de atividade física, uma alimentação saudável e o convívio com a família.

* Em vez de focar no que falta, valorize o que já foi feito.


Quer ter acesso a todos os conteúdos exclusivos de VOCÊ S/A? Clique aqui e assine VOCÊ S/A.

Powered by WPeMatico