Você quer tudo na sua hora?

Nos últimos tempos, tenho escutado mais relatos sobre o que parece ser uma nova noção de tempo no trabalho, principalmente nos casos de quem atua remotamente ou no modelo híbrido. Tudo é para ontem, urgente, ASAP (sigla em inglês que pode ser traduzida como “tão logo seja possível”).

Essa pressa toda, contudo, não é exatamente novidade — apesar dela ser mais intensa atualmente. O que parece diferente e chamou a minha atenção é o uso das ferramentas de comunicação para reforçar um senso de urgência que nem sempre é justificado. Estou falando daquela demanda de trabalho no WhatsApp tarde da noite ou mesmo de madrugada, daquela pessoa que envia uma mensagem para avisar que mandou um e-mail, daquelas notificações que não param de surgir no aplicativo de comunicação interna da organização, daquela caixa de entrada lotada que parece nunca ter fim… 

Claro que, no dia a dia da empresa, acontece de um pedido ser mesmo urgente e de uma mensagem aparecer no nosso celular fora do “expediente” — entre aspas porque, com a possibilidade de atuar remotamente, a noção de jornada tradicional não faz mais tanto sentido. O problema não é esse e também não tem a ver com as ferramentas de comunicação em si, mas com a imposição do seu tempo sobre o tempo dos outros. Vou explicar melhor.

Se, por um lado, os aplicativos de comunicação permitiram nos conectar com pessoas em qualquer lugar e a qualquer hora, por outro, eles podem gerar uma impaciência na espera por um retorno. Pode parecer óbvio dizer que não é porque o envio de uma mensagem é instantâneo que a resposta também será. Não é porque você aproveitou a flexibilidade da empresa para trabalhar de noite, quando sua produtividade é melhor, que o fornecedor também estará em frente ao computador nesse horário e, portanto, vai responder sua solicitação no minuto seguinte. Sabemos de tudo isso na teoria, mas, na prática, parece que o apelo ao imediatismo fala mais alto e, quando percebemos, estamos checando a cada segundo se a outra pessoa nos respondeu e ficamos incomodados com a “demora”. Tudo tem que ser no nosso tempo, não no tempo do outro.

Porém, se queremos construir ambientes e relações de trabalho mais saudáveis, precisamos mudar essa dinâmica.

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Comunicação assíncrona, veja bem, não é sinônimo de instantaneidade. Isso significa que hoje a comunicação não se estabelece ao mesmo tempo para todos. Um indivíduo pode mandar uma mensagem no horário que for melhor para a sua própria rotina e receber um retorno no momento que for mais oportuno para o outro. Entender isso é o primeiro passo para melhorar a interação das pessoas na empresa. 

O segundo diz respeito a reavaliar o significado de “urgente”. Se você está sempre correndo contra o tempo e precisa de respostas “pra ontem”, talvez possa existir um problema de planejamento — e não é a sigla ASAP em um e-mail que vai resolver isso. Urgências existem, mas elas não deveriam ser a regra de uma rotina de trabalho saudável. Vale avaliar e entender qual é a fonte dessa pressa toda.

Outro passo importante para tornar a comunicação no trabalho menos ansiosa e mais eficiente é trabalhar o valor da confiança. Não raras vezes, o incômodo por não receber um retorno na mesma hora vem de uma desconfiança de que a outra pessoa não está trabalhando tanto quanto você, que está “enrolando”, que ela está despriorizando a sua demanda. Mas a verdade é que cada um tem o seu tempo e é importante confiar que, se alguém da sua equipe ainda não respondeu, é porque ou não teve a oportunidade de pensar melhor sobre o assunto, ou ainda está refletindo sobre o tema, ou precisou resolver algo antes e por aí vai. O importante aqui é não tornar a comunicação assíncrona uma forma de pressionar e de medir a produtividade do time.

Claro que, para esse vínculo de confiança existir, é fundamental estabelecer boas práticas de comunicação na empresa — o quarto passo dessa jornada. Você pode criar reuniões periódicas para atualização de status de projetos e combinar que eventuais urgências (que forem urgentes de verdade) serão informadas pelo aplicativo de comunicação corporativo. Mais do que isso, é importante explicar porque aquele item é de fato importante e precisa ser priorizado pela equipe.

Também vale estabelecer prazos na sua comunicação. Ao solicitar um orçamento para um fornecedor, por exemplo, explique até quando você precisa de um retorno. No caso de uma demanda interna, pergunte ao seu colega se é possível dar uma resposta até determinada data. Assim, você evita ficar ansioso e gerar ansiedade no outro. 

Essas são algumas recomendações básicas, mas que podem fazer toda a diferença no dia a dia de uma comunicação assíncrona equilibrada, respeitosa, saudável e, consequentemente, eficiente.

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